Economia

‘O lugar do dólar é mais perto de R$ 3 do que de R$ 2’

Especialista em câmbio diz que, com mudança na política monetária nos EUA, o Brasil precisa passar por ajustes nas taxas de câmbio e de juros, que estão ‘erradas’

RIO – Sócio da Cenário Investimentos, José Alfredo Lamy afirma que juros básicos precisam voltar para a casa dos dois dígitos — ou seja, igual ou maior que 10% ao ano — para o país enfrentar a maior pressão inflacionária.

Por que o programa de recompra dos títulos públicos americanos afeta nosso mercado?

O Brasil foi muito favorecido nos últimos anos com a política americana de juros. Quem investia nos EUA, com o juro muito baixo por lá, buscou aplicações mais rentáveis em países emergentes, como o Brasil. Isso trouxe muitos dólares ao país, ajudou a jogar a cotação da moeda para baixo, a termos inflação menor e juros menores. O Federal Reserve (Fed, banco central americano) indicou, com o possível fim do programa de recompra dos títulos públicos, que essa política de juros vai ser normalizada, ou seja, vai acabar (a recompra) daqui para frente.

E quais serão os impactos?

O dinheiro que veio para o Brasil ao longo desses anos começa a sair, retornar para sua origem, nos Estados Unidos e em outros países. O Brasil terá que corrigir, ao longo dos próximos meses ou anos, dois fatores que estão errados: o câmbio e os juros. Estão errados porque foram favorecidos pela economia externa. Dez anos atrás, o câmbio estava em R$ 2. Tivemos 80% de inflação desde então. Em condições normais da economia americana, retornando à normalidade, o lugar do dólar é mais perto de R$ 3 do que de R$ 2. E, nesse cenário, teremos que fazer uma correção na política monetária. Vamos precisar retornar os juros para dois dígitos.

O crescimento será afetado?

O crescimento já está baixo, já estamos com PIB (Produto Interno Bruto, conjunto de bens e serviços produzidos pelo país) potencial baixo. Vamos ter que fazer uma mudança de rota no câmbio e juros e o Brasil vai passar por um período de vacas magras, com menor crescimento econômico. Desde a década de 70, toda vez que o mundo deixou de financiar o Brasil, o país não foi bem.

Isso é uma exclusividade do Brasil?

Isso vale para todos os países emergentes. Mas não tenho dúvida de que, entre eles, o Brasil é o que tem fundamentos piores: política fiscal expansionista, pouco investimento e inflação por pressão de demanda que não está sendo correspondida pela oferta.